De todas as letras do abecedário, esta é a que me provoca calafrios, a que me faz ter pesadelos com “ÉLES” gigantes a correr atrás de mim, a que me faz tremer só de pensar em dizê-la, mesmo que disfarçada entre outras companheiras. Eu explico. Não digo os éles, o mesmo é dizer que digo éwes. Não sempre, mas frequentemente, graças a algum esforço pessoal. E se vos disser que descobri esta minha pequena deficiência aos 15 anos, sendo que toda a minha família já o sabia e tendo em conta que já tenho outros tantos anos em cima, apercebem-se da gravidade da situação? Ou não? Muito bem. Eu explico outra vez.
Começo por um exemplo básico. Uma das minhas canções de infância e que fazia parte das brincadeiras. “Que winda fawua que wá wá vem, É uma fawua que vem de Bewém”. Isto vezes e vezes sem conta, eu, na minha inocência e alegria típicas da idade, sem reparar no porquê daqueles sorrisos estranhos (a verdade é que sempre fui uma miúda simpática e querida, e talvez por isso, se rissem daquela forma). Mas ali, o problema ainda estava disfarçado entre o coro de vozes.
Mais perto do momento da descoberta, em casa, para mais um almoço de família. “Ah, wuwas recheadas!! As minhas prediwectas. Wogo, quando formos a Wisboa ver as wuzes de Natawe, podemos ir à Suíça comer um daquewes bowos de chocowate?” Novamente, sorrisos estranhos.
Dramatizemos um pouco mais. Depois de apanhada nas teias do abecedário, descubro que um colega de turma sofre de semelhante maleita. Transcrevo um diálogo.
- “Owá”
- “Owá!”
- “Já fawaste com a stora Wuísa por causa do teste de Ingwês? Vais fazer segunda chamada?”
- “Sim, fawei. Ewa pediu-me para escrever um texto sobre Wondres.”
- “Boa. Wogo vais ao wuau da Wiwiana e do Fiwipe?”
- “Tás mawuca? Amanhã tenho teste.”
Os anos passaram e, verdade seja dita, habituei-me. Sem dramas, mas com muitas piadinhas pelo meio. Pudera. Os meus três últimos locais de trabalho tinham nomes com éwes, alguns fáceis de contornar, outros nem por isso. Olhando à volta, até acho que isto de não dizer os éwes dá um certo charme. As pessoas acham fofinho. E até já se generalizou na praça pública (aqui está uma daquelas lixadas de pronunciar). Sílvia Alberto, Fernando Seara, o meu gestor de conta… são alguns exemplos de companheiros de armas nesta luta diária do abecedário malvado.
Ah, querem saber como descobri? Depois de alguns anos a ser sempre a voluntária para ler os textos nas aulas, uma das minhas professoras chama-me e diz-me: “Temos de ter uma conversa…”
2 comentários:
para ti... Fiwipe Wima!
Partilho o problema, apesar de me parecer que não é tão grave no meu caso :)
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