O sol começava a aquecer através das vidraças, ao ponto de incomodar o corpo e a vista. Era um típico dia de final de Primavera, já com o Verão a espreitar, ainda tímido. Os jardins estavam floridos, a relva bem verdinha, as abelhas esvoaçavam e os passarinhos cantavam.
O dia de trabalho estava também a começar, da mesma maneira de quase sempre: e-mails, agenda do dia e café.
Estava, portanto, a dar início à jornada de trabalho...
É então que a porta de vidro se abre, aliviando um pouco o incómodo do sol na vista. A figura feminina que acabava de entrar escondeu por completo o resto dos raios de sol, tal era a sombra... O chilrear dos passarinhos deu lugar a uma voz estridente com pronúncia do norte que só não partiu o meu copo de água porque era de plástico. Os jardins floridos e a relva verde deram lugar a um lamaçal tremendo...
"Os condomínios, estamos todos muito aborrecidos... Vocês não fazem nada. Se o jardineiro não faz, têm de fazer, agora assim é que não"... As palavras entravam dolorosamente na minha cabeça, não pelo conteúdo em si mas pelo tom agudo com que eram proferidas...
"As sementes foram semeadas e ainda não cresceram, não é? Demora tempo, sei, mas há duas semanas e nada. E além disso, o jardineiro disse que ia colocar o casquilho e nada ainda. Como é?"
O alarme disparou na minha cabeça. "Casquilho...? Falta colocar iluminação no jardim...?"
"Não é esse, é o casquilho castanho para pôr em cima da relva"...
Foi um belo dia de final de Primavera...